No que toca a excessos e atentados ao bom gosto, batemos qualquer um. Basta deslocarmo-nos a uma praia durante um dia de semana para confirmar o triste quadro. Você chega às 11 horas da manhã de uma quinta-feira sem história, a praia de Valadares estará tão sobrelotada que será difícil abrir um guarda-sol sem causar feridos. Você encontra um local mais livre mas passados poucos minutos eis que chega uma família inteira - uns dez - que se instala mesmo ao nosso lado. Você foi adoptado!
Um adolescente tirou um enorme rádio portátil da mochila, mais conhecido por tijolo e tratou de dar música a todos os banhistas, da praia de Valadares a Espinho. A parafernália de geleiras, garrafões, sandes mistas e jogos de praia faz crer que se tenham instalado para o resto da quinzena.
Uma das crianças, com pouco mais de 8 anos, fato de banho a cair-lhe pelos joelhos e a boca lambuzada de gelado de chocolate, decidiu ir dar um mergulho sem pedir autorização. O pai não gostou da ideia. Pregou-lhe um estaladão tão grande que lhe virou a cabeça ao contrário. A choradeira não tardou.
No parque de estacionamento, ei-lo perante o último pesadelo nacional: o colete reflector amarelo tornou-se a bandeira nacional. Em 100 carros, mais de metade tem um dos bancos da frente (regra geral o do condutor) vestido com aquela coisa berrante de nylon.
Acredito que em Portugal se tem apurado o bom gosto, muito por força do aumento do poder económico da classe média e por influência dos (muito poucos) media. Mas apesar deste banho de civilização, continuamos a ser um povo onde o mau gosto prevalece: são as tais maisons dos emigrantes, a peúga branca com sapato preto, anéis tipo cartucho... A mania da ostentação é gritante. Somos um país pindérico, gastamos o que não temos e mostramos as aquisições cheios de orgulho. É lamentável... Pior mesmo se pensarmos na rica televisão que nos apresenta em horário nobre coisas chamadas Malucos do Riso e Batanetes, os treinos da equipa vermelha da segunda circular, entrevistas ao orelhas, políticos que oferecem electrodomésticos durante as campanhas eleitorais, que se servem das autarquias para concretizar sonhos da juventude - o Rio fez a sua corridinha privada de automóveis antigos à custa da edilidade -, insistimos em cuspir para o chão, vemos os nossos filhos a sair da escola e a deitar o papel do chocolate para o chão, na praia andamos de tanga e sandálias com meias. Veneramos o automóvel e fazemos dele um monumento ao kitsch: terços, cd's e porta chaves pendurados junto ao espelho retrovisor; almofadas e cães de peluche no banco traseiro, autocolantes, cachecóis e bandeiras de Portugal... No carro fazemos tudo: ao fim de semana, com o dito virado para o mar, os cavalheiros ouvem relatos, as senhoras fazem renda, cortam-se unhas. E se não fosse o automóvel, como é que se praticava o desporto nacional de verão: o piquenique à beira da estrada? O melhor dia é o domingo, quando há mais movimento rodoviário. Porque piquenique sem carros a passar, não é piquenique, não é nada.
Aqui em Leça da Palmeira temos dois parques, com muito verde, muitas árvores, mas é ver os piqueniqueiros a confraternizar junto à estrada, por baixo da ponte móvel, nos sítios mais incríveis...
Podem pensar que o que apontei atrás é demasiado duro. Mas sinceramente, olhem à vossa volta. Políticos: um bando de grunhos saídos das cavernas, em que um ministro recentemente empossado para a pastas das finanças não paga/declara desde 2000 os seus rendimentos às... finanças... O país em crise e insistem em obras faraónicas tais como o aeroporto da Ota ou o TGV e deixam na gaveta o desemprego, o saneamento, a saúde, a segurança... Insistem num fóssil para Presidente da República, nas eleições prometem que não aumentam os impostos, que não vão fazer nomeações indiscriminadamente e depois de eleitos é o que sabemos... A imprensa: é só ler as revistas cor-de-rosa a mostrar, literalmente, um bando de paneleiros, putas, e demais parasitas das classes mais altas todos incultos...
Viver em Portugal é mesmo uma tarefa árdua e inglória.