O projecto foi apreciado pela Comissão Municipal de Estética, da qual faziam parte o arquitecto Marques da Silva e um ilustre arquitecto inglês que se encontrava no Porto a convite da Câmara, Barry Parker. Será a este arquitecto inglês, paladino do conceito da cidade-jardim, que a Câmara vai encarregar de elaborar um novo plano da avenida.
Barry Parker vai propor uma avenida como um espaço comercial e de passeio. Teria uma ampla placa central ocupada por vegetação e pérgulas. O edificado seria composto por prédios baixos que, ao nível do piso térreo, teriam uma arcada que daria acesso a estabelecimentos comerciais.
O projecto de Barry Parker foi aprovado e as suas ideias mestras observadas: a avenida em “forma de bacalhau”, a clara identificação das praças da Liberdade e do Município (hoje, do General Humberto Delgado), o eixo central unindo a estátua de D. Pedro com o centro da fachada da nova câmara, a localização do edifício dos paços do concelho e o traçado das ruas que o ladeiam.
No entanto, o edifício da Câmara Municipal que hoje temos nada tem a ver com o idealizado por Barry Parker. O arquitecto da cidade-jardim propunha um edifício de apenas dois pisos de estilo neoclássico que permitisse, a quem subisse a avenida, ver a torre da igreja da Trindade por detrás, criando a ilusão de pertencer ao próprio edifício da câmara. Para além dos paços do concelho, o projecto de Barry Parker foi também totalmente desvirtuado no que diz respeito à arquitectura dos edifícios que ladeiam a avenida.
Embora reconhecessem a validade do traço urbanístico proposto, a administração camarária da época e os seus técnicos mais conceituados – com formação francesa e uma clara preferência pelas beaux-arts – não se identificam com a contenção anglo-saxónica proposta por Barry Parker. As suas expectativas inclinavam-se claramente para um estilo mais ornamentado e exuberante.
Cem anos de avenida
A 1 de Fevereiro de 1916, com a presença do presidente Bernardino Machado, dava-se início à demolição do antigo edifício da Câmara Municipal, inaugurando-se a construção da avenida, primeiro chamada “da Cidade” ou “Central”, depois da Primeira Guerra Mundial, “das Nações Aliadas”, e, mais tarde, apenas “dos Aliados”.
Do arquitecto Marques da Silva são os projectos dos dois monumentais prédios que marcam o arranque da avenida – o da sede da seguradora “A Nacional” e o do edifício “Pinto Leite” – que definem claramente a separação entre a praça da Liberdade e a avenida dos Aliados, como era intenção de Barry Parker.
No período que medeia entre as duas guerras mundiais, irão sendo progressivamente edificados quase todos os edifícios da nova avenida. Haverá liberdade para cada arquitecto propor o estilo que entender. Apesar disso, a avenida terá uma arquitectura bastante coerente, com fachadas a alternar entre o ecletismo ao gosto fin-de-siècle até à chamada art-déco que resultou do estilo difundido a partir da Exposition des Arts Décoratifs, realizada em 1925 em Paris.
Em 1929, no início da placa central da avenida, inaugura-se a escultura “Juventude”, mais conhecida como “A Menina Nua”, do escultor Henrique Moreira com pedestal do arquitecto Manuel Marques e, em 1932, “Abundância” ou “Os Meninos”, um pouco mais acima, dos mesmos autores.
A monumentalidade da nova avenida obrigou também à reformulação da frente urbana da velhinha praça da Liberdade. Com a excepção do edifício das Cardosas e do da Casa Navarro, todos os restantes foram reconstruídos ou, pelo menos, viram as suas fachadas profundamente alteradas.
Recusada a proposta de Barry Parker para a nova sede da autarquia, foi realizado um concurso público, da qual sai vencedor o arquitecto António Correia da Silva. A construção do edifício inicia-se em 1920 mas só é inaugurado em 1957.
Para além dos serviços do Estado – Paços do Concelho, Banco de Portugal, Caixa Geral de Depósitos, Correios (bastante mais tarde) –, na nova avenida e no seu entorno instalam-se as sedes dos principais jornais, de bancos privados, de companhias de seguros e de diversas empresas. Consultórios médicos, escritórios de advogados e engenheiros, ateliês de arquitectos, cafés, confeitarias e outros estabelecimentos comerciais de prestígio – todos buscam instalar-se por aí.
Em 2004, mercê da construção da linha D do Metro do Porto – que previa a abertura de uma estação em plena avenida dos Aliados –, é encomendado aos arquitectos Álvaro Siza Vieira e Eduardo Souto de Moura a requalificação de todo o eixo urbano. Recusando a sequência praça-avenida-praça tão caras a Barry Parker e a Marques da Silva, Siza Vieira contrapôs um espaço único, uma grande praça da cidade. Para tal, entre outras medidas, propõe a utilização de um só material de revestimento de pavimento, procurando introduzir um factor de união visual de todo o espaço. Siza propunha ainda a deslocação da estátua equestre de D. Pedro IV e sua rotação de 180 graus, o que acabou por não acontecer. O projecto foi muito contestado, mas acabou por ser concretizado quase na íntegra. Apesar de já ter passado uma dúzia de anos, muitos portuenses continuam hoje a lamentar o desaparecimento da calçada portuguesa e dos espaços ajardinados da placa central que foi pavimentada com placas de granito. [daqui]