Paris cai nas mãos dos alemães!
A notícia de que os exército alemães avançavam em todos os sentidos provocou então a Grande Debacle. André Maurois, o escritor, foi testemunho do desastre. De todas as aldeias da Bélgica e do norte da França, uma imensa coluna humana começou a se movimentar-se para o sul, para dentro do território francês, em busca de abrigo. Homens. mulheres, idosos, crianças e adolescente com suas bicicletas, milhares de automóveis, carroças, carretas, carrinhos de mão, atulhados com os trastes da população em fuga, atravancaram as estradas da região. Os reforços que foram enviados para tentar barrar as linhas de penetração alemã, tiveram que antes enfrentar aquele aluvião humano que não parava mais de derramar-se. Era uma paisagem bíblica. Um povo inteiro fugia perante o invasor. Ninguém parava para resistir, sequer esboçavam um gesto de defesa. A França caminhava com seus próprios pés para o colapso. No quartel general francês, conscientes do desastre nacional, os oficiais se abraçaram e choraram.
No dia 14 de junho de 1940, um mês antes da celebração da data nacional francesa, o 14 de julho, a infantaria alemã, ao som marcial das bandas militares, desfilava pelos Campos Elísios numa Paris semideserta, abandonada sem luta ao invasor. Se bem que em Dunquerque, na Bélgica, mais de 100 mil soldados franceses tivessem conseguido escapar junto com 220 mil ingleses, embarcados para ao outro lado do Canal da Mancha, na tão conhecida Retirada de Dunquerque, ninguém na França naquela momento acreditava na possibilidade de continuar a resistência. O governo do Primeiro Ministro Paul Reynaud que havia se retirado para o interior, aceitou dar inicio às negociações de paz, e logo depois renunciou. Na Alemanha quando finalmente acertou-se o cessar fogo para o dia 25 de junho de 1940, Hitler ordenou que todos os sinos do país repicassem durante uma semana para celebrar a "maior vitória em todos os tempos". No após guerra, Liddell Hart comentando a Campanha da França observou que ela poderia ser descrita como "um dos mais acabados exemplos na história dos decisivos efeitos de uma idéia, aplicados por uma execução dinâmica" (in The other side of the Hill).
As razões da derrota francesa
Abraão Lincoln, num célebre discurso chamado "A casa dividia", alertou que nenhum país pode perdurar para sempre parecendo-se como um casa dividida. Pois a França de 1940 era uma casa dividida. Um perceptível sentimento de ódio de classes, de ódio ideológico, entre a direita e a esquerda francesa (entre os fascistas da Croix de Feu e a Frente Popular), envenenara o esforço de guerra que a França deveria ter feito nos anos 30 e não fez. A origem da desavença ideológica vinha dos finais do século 19, dos tempos do affaire Dreyfuss (quando um oficial de origem judaica Alfred Dreyfuss, que servia no Estado-maior francês, foi acusado e preso, em 1895, de ser espião do império alemão). O furor anti-semita que o caso provocou, cindiu a sociedade francesa em duas partes irreconciliáveis. A direita acusava a existência de um "complô judeu" anti-nacional, enquanto a esquerda e os democratas em geral, apoiaram a inocência de Dreyfuss, que terminou reintegrado ao exército em 1906. A Primeira Guerra Mundial que eclodiu em 1914 momentaneamente sepultou aqueles rancores, mas depois, com a crise de 1929, novamente o clima se azedou em toda a França. As greves sucessivas, as ocupações das fábricas, o laissez-passer dos comitês de greves, o ódio que a burguesia e a classe média tinham do proletariado, tudo isso contrastava com a coesão totalitária da Alemanha hitlerista dos anos 30.
Em abril de 1936, uma frente da esquerdas (socialistas e comunistas) venceu as eleições francesas. O Front Populaire (sem a participação dos comunistas no governo) porém, estava marcado pelo pacifismo do seu líder Leon Blum, um intelectual judeu que rejeitava participar da 3ª Internacional Comunista e que era um fervoroso adepto da causa da paz. Se foram significativas as alterações que ocorreram na sociedade francesa para a melhoria da vida dos trabalhadores (avanços salariais, férias pagas e jornada de 40 horas de trabalho, convenções coletivas homologadas), houve uma total incúria da parte de Leo Blum e dos seus sucessores no tangente à preparação para uma provável confrontação militar no futuro. Afinal, Hitler já estava no governo desde 1933 e nunca escondera que sua política era restaurar a plenitude do poder alemão, perdido na guerra de 1914-18. Apesar da curta duração do governo da Frente Popular (1936-7) e da sua negativa em auxiliar militarmente o lado republicano da Guerra Civil espanhola, onde o exército do General Franco e os falangistas (os fascistas espanhóis), rebelaram-se com sucesso, em 18 de julho de 1936, contra o governo da Frente Popular espanhola, a direita francesa não se envergonhou de difundir o slogan "melhor Hitler do que Stalin!".
Quando a guerra começou em 1939, a França estava, pois, inerte. A sua estratégia era defensiva, era esconder-se atrás da Linha Maginot, enquanto que na retaguarda, as rivalidades entre esquerdistas e direitistas, sindicatos de trabalhadores e organizações patronais, minavam quaisquer possibilidades do pais agir coeso frente ao terrível perigo que corria. Assim, entre a cegueira e a irresponsabilidade, o país colocou seu próprio pescoço para que o a lâmina da guilhotina nazista a decepasse.