Kosta de Alhabaite

Nortenho, do Condado Portucalense

Se em 1628 os Portuenses foram os primeiros a revoltar-se contra o domínio dos Filipes, está na hora de nos levantarmos de novo, agora contra a corrupçao, o centralismo e colonialismo lisboeta!

Olhares cruzados sobre o Porto


Ocorreu ontem à noite, na Universidade Católica, mais uma conferência do terceiro ciclo “Olhares Cruzados sobre o Porto”, uma organização conjunta daquela instituição de ensino e do jornal ‘Público’. Os oradores foram José Manuel Fernandes, director daquele diário, e Paulo Rangel, professor universitário e deputado, com a moderação entregue a Rui Moreira, presidente da Associação Comercial do Porto.

O debate foi iniciado com Rui Moreira a colocar uma série de perguntas que serviriam de leitmotiv para o debate, nomeadamente, “se os problemas do Porto serão muito diferentes dos de Lisboa”, alertando, desde logo, para a possibilidade de existirem duas “Lisboas”: a cidade e a capital. E não deixou de fazer alguma introspecção local e regional, quando lançou para o ar a pergunta sobre se o Porto não terá sido cúmplice desse mesmo centralismo, ao acreditar, de
forma laxista, que a situação se auto-resolveria.

Paulo Rangel tomou a palavra e anunciou que, antes de iniciar a reflexão temática proposta, gostaria de enquadrar a questão no âmbito daquilo que chamou de “micro-geopolítica”, algo que o decorrer da sua intervenção acabaria por explicar, estabelecendo quatro pressupostos:

  1. Centralismo – existe e todos o sentem e acaba de ver reconfirmado através do anúncio de obras faraónicas.
  2. Inexistência de uma só Lisboa – “há, pelo menos, uma Lisboa com duas faces, qual Jano, a capital e a cidade, sendo esta a primeira vítima daquela”…
  3. Rivalidade – “Lisboa não é rival!”.

Para Paulo Rangel isso deve-se ao facto de ela própria não se rever nessa qualidade, cultivando a indiferença, desconhecendo o que se passa fora da urbe. No fundo, “Lisboa brinca com o sentimento de rivalidade".

  1. Não é aliada – Se não é rival, também não se vê como aliada.

Na opinião do orador, Lisboa apenas olhou para o Porto com alguma consideração em alturas de conflito armado ou de supremacia económica. Assim, a Invicta, para se afirmar, terá de dar como assente o facto de que qualquer estratégia que pretenda seguir jamais deva ter Lisboa em conta. Até porque “a vocação da capital é a de cidade global e de polis mundial”. Assim, o caminho que o Porto deve seguir é o de “pensar sozinho”, e, principalmente, o “de renunciar a qualquer título desde «capital do Norte» a «segunda cidade do país»”. Isto porque o Porto não é “anticapital”, nem segunda, terceira ou quarta cidade, “o Porto é o Porto”, destacando aqui a omnipresença do artigo definido “o” que sempre acompanha o topónimo.
Fazendo um pouco de História, Paulo Rangel recordou o sonho da cidade em ser uma cidade média europeia ou a capital do noroeste ibérico. Só que o alargamento comunitário terá trazido uma enorme modificação: “Bruxelas está mais longe, Madrid está mais perto”. Daí que uma maior integração com Espanha seja uma via de futuro, sendo certo que as diferenças e o respeito pelas identidades próprias serão valores a manter, sempre. Surgiria aquilo que o palestrante rotulou de “Iberolux”, em clara analogia com o pioneiro “Benelux”.
Então, as cidades terão de escolher entre um modelo bipolar e um multipolar.
Enquanto no primeiro o que temos é um enorme cidade que faria girar uma série de infraestruturas à sua volta, à semelhança das cidades-estado gregas ou “solução João Cravinho”… A segunda alternativa passaria pela criação de uma rede de cidades médias (Aveiro, Porto, Braga, Guimarães e Viana do Castelo, p.exp), dotadas de infraestruturas de ligação entre si e onde os centros de decisão estariam dispersos. No fundo teríamos “um Estado de Cidades contra uma Cidade-Estado”.
Quanto ao Porto propriamente dito, será necessário que ele se empenhe num processo de salvaguarda da Portugalidade, até porque, na Galiza, já há uma rede a englobar sete cidades e duas delas são maiores do que a Invicta: Vigo e A Coruña. Para impedir isto é preciso que a massa crítica apareça e se desenvolva.

A hipótese que poderia motivar um novo arranque para a cidade e para a região, preconizada por Paulo Rangel, é a da fusão dos concelhos de Porto e de Gaia. Um projecto destas cracterísticas teria a faculdade de agradar a muita gente, ao fazer descer a burocracia administrativa, ao criar economias de escala, ao possibilitar uma melhor gestão do rio e voltaria a unir os dois centros históricos. Até porque “Portus+Cale foi de onde nasceu o nome de Portugal”. Esta seria a fórmula para o Porto se afirmar no plano ibérico e nacional, sendo que o faria pela positiva, uma vez que não era “contra” nada.

José Manuel Fernandes optou por uma perspectiva radicalmente diferente, mas algo complementar. O director do Público começou por fazer um retrato do país, com base em elementos estatísticos. Desta forma, demonstrou como o país está demograficamente desequilibrado, com mais quantidade de população junto ao litoral e, no contexto europeu, nota-se uma predominância dos sectores primário e secundário, enquanto o resto da Europa já está mergulhada no sector terciário.
Lisboa é a região mais rica do país”, confirmou José Manuel Fernandes, “só que o problema não é o da autonomia ou o do confronto cidade-capital”. Na sua opinião, “o que leva as pessoas para a capital é o chamamento da Administração Pública e a ideia de que ela se concentra em Lisboa”. Prova disso é que empresas que tinham o seu centro de decisão no Porto o passaram para Lisboa, como o BCP e o BPI, apesar de, na capital, tudo ser substancialmente mais caro. Mas o que particulares e empresas já constataram é que, em Portugal, nada se pode fazer sem chocar contra o mastodonte que se chama Administração Pública. E o orador “maravilhou” a audiência com vários exemplos da ineficiência, absurda, da nossa Administração.

Assim, identificado que está o problema, “Porto e Lisboa deviam efectivamente aliar-se para pôr o paquiderme a mexer-se”. A razão para esta falta de capacidade de luta residirá, provavelmente, na circunstância histórica de desde há 180 anos não termos qualquer guerra no nosso território, o que nos retirou qualquer capacidade de sofrimento. Assim, a solução para o problemas das cidades, e não só, passa pela “reengenharia dos processos de decisão”.

Entre os presentes estiveram algumas caras conhecidas dos meios empresariais, associativos e políticos do Porto e, também, alguns bloggers. Um deles colocou uma boa questão. Começando por esclarecer o seu actual background americano e a sua área de conhecimento científico, mostrou-se incrédulo perante o constante esquecimento de nomes do Porto para dirigir os principais organismos científicos nacionais, quando a cidade possui um pólo universitário com formação e valor científico bem mais importante do que o da capital. E deixou uma sugestão, pragmática (à americana …): “mais do que prognósticos gostava era de saber quais as terapias a aplicar...
O problema do Porto e da sua perda de influência não pode ser reduzido a uma só questão.
Há razões que se cruzam e que passam, certamente, pelo problema administrativo-político mas que também estão ligados a má gestão autárquica e à pouca ou nula importância de organismos como a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, que tenho a impressão que existe mais para complicar do que para simplificar…

A solução da fusão Porto-Gaia não é para mim a melhor solução. Continuo a achar que o Rio Douro é uma fronteira a ter em conta. Aceitaria e até apoiaria com firmeza uma junção com Matosinhos, Maia e Valongo. Assim, sem fronteiras geográficas (o rio) seria muito mais fácil articular todas as infraestruturas e o poder desta nova urbe, qualquer que seja o ponto de vista, seria enorme. Os ganhos pessoais, económicos, políticos e sociais seriam tremendos. Corria-se o risco, é certo, de mimetizar os tiques e defeitos de uma cidade centralizadora, como Lisboa, mas aí haveria de se contar com gente capaz de contornar esse problema, esperando-se que essa mole de dinossauros autárquicos que por aí ainda vegeta se abstivesse de lá colocar as unhas.
Por outro lado, este processo de fusão não seria propriamente inédito. As empresa fazem-no todos o dias. Os países também – afinal, o que é a União Europeia? Então porque não as cidades? Aliás, os que têm melhor memória recordar-se-ão de uma discussão que começou na blogosfera poveira-vilacondense, sobre a eventual criação de uma “Póvoa do Conde”. Na altura, o ‘Terras do Ave’ pegou no assunto e fez uma reportagem onde também se indicavam os números desse super-concelho, com uma força enorme na Área Metropolitana do Porto. É claro que para isso seriam necessários autarcas com visão e não alguns como os que conhecemos acantonados na sua terra, sem visão para além dos limites do concelho, como se prova pela marginal que liga Vila do Conde e a Póvoa de Varzim: não só muda a decoração pública como a própria faixa de rodagem tem uma brusca mudança de dimensão.
Portucale? Póvoa do Conde? Porque é que não?

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