As conclusões da Autoridade Tributária acabaram por ser uma peça fundamental na investigação.
Grande parte dos indícios apresentados ao ex-primeiro-ministro José Sócrates, quando foi detido, a 21 de Novembro, do ano passado, fazem parte das conclusões da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que colaborou com o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP).
Segundo uma fonte próxima do processo, a AT refere que surgiram suspeitas de que Sócrates beneficiou de montantes ocultos provenientes de negócios de que terceiros tiraram proveito. Carlos Santos Silva, apontado como testa-de-ferro, terá sido uma dessas pessoas.
O juiz de instrução, Carlos Alexandre, terá feito fé nas conclusões do Ministério Público (MP) e explicado a José Sócrates os indícios que levaram à sua detenção. Partindo do princípio que Santos Silva era amigo de Sócrates, sustenta-se que ambos terão delineado um plano, a partir de 2005, depois de José Sócrates ter assumido o cargo de primeiro-ministro. A ideia dos investigadores é que os dois montaram um estratagema para trazer os fundos de Carlos Santos Silva para Portugal e reuni-los em contas tituladas pelo próprio. A investigação aponta que esses fundos sejam pertença de José Sócrates, mas distribuídos por contas de Carlos Santos.
O processo dá conta da transferência para Portugal de 23 milhões de euros através do regime excepcional de regularização tributária (RERT).
Os mesmos indícios apontam que a partir de 2012 tivesse havido uma actuação conjunta de Sócrates e do empresário para haver uma transferência de verbas entre os dois, sem nunca acontecer directamente entre contas. Entre outras operações, o MP relevou a compra de um imóvel em Paris por 2,8 milhões de euros, a venda de imóveis da mãe de Sócrates a Carlos Santos Silva, e entregas em cash ao próprio José Sócrates. Fonte judicial refere que nessas entregas em numerário Sócrates usaria expressões como “folhas de dossiê” e “fotocópias” (ver texto ao lado). Os investigadores referem que as entregas foram feitas pessoalmente através do motorista João Perna, do advogado Gonçalo Ferreira e sua mulher, Inês Rosário. São identificadas entregas que ascendem pelo menos a 350 mil euros, sendo algumas delas referidas no processo como tendo envolvido montantes entre 10 e 50 mil euros ou 10 e 100 mil euros.
Outra forma de transferências de dinheiro terão sido os fundos para comprar o livro assinado por José Sócrates. Neste caso são indicadas como tendo ajudado o ex-primeiro-ministro o deputado socialista André Neves Figueiredo, a antiga secretária de gabinetes de governantes socialistas Maria Lígia Correia, o advogado Gonçalo Ferreira, o motorista João Perna, o autarca Carlos do Carmo Martins, o sócio de Carlos Santos Silva, Rui Mão de Ferro, e o dirigente socialista Renato Sampaio.
O Ministério Público refere ainda que haveria depósitos na conta de João Perna que depois iriam parar a Sócrates ou custeavam as suas despesas. Sandra Santos, uma amiga de Sócrates que mora na Suíça, também terá recebido dinheiro de Carlos Santos Silva a pedido do ex--governante.
Outra das alegações é que José Sócrates Pinto de Sousa participou, juntamente com o amigo empresário, em negócios relacionados com transmissões televisivas desportivas, designadamente os direitos de transmissão em Portugal da liga espanhola. Neste negócio é referido Rui Pedro Soares, ex-administrador da PT e presidente do Belenenses. De resto, este caso terá sido o que desencadeou toda a investigação.
Ainda como fazendo parte dos factos pelos quais Sócrates é indiciado está uma alegada tentativa de simular um duplo salário: 12 500 euros recebidos em Portugal e o mesmo montante a partir da Suíça. Um caso ainda referido é o interesse de Sócrates na aquisição de uma propriedade no Algarve a meias com Santos Silva.
Já depois de ter sido detido, José Sócrates foi acusado informalmente de tentar esconder o computador pessoal e de ter impedido que as buscas se realizassem no dia determinado. Segundo os investigadores, o ex--primeiro-ministro terá respondido que o seu computador estaria em Paris e que até se disponibilizava a acompanhar os agentes à capital para recolher o aparelho. Porém, os elementos da AT explicam que naquela altura o ex-primeiro-ministro ficava hospedado num hotel quando se deslocava àquela cidade.
O computador em causa viria a ser apreendido numa casa vizinha no prédio onde Sócrates residia, na Rua Braamcamp, em Lisboa. Relativamente ao impedimento das buscas, é referido que Sócrates soube antecipadamente da detenção do motorista e não embarcou no voo reservado, uma vez que terá alterado a reserva cerca de meia hora antes. Posteriormente voltou a adiar a viagem e acabou por chegar a Lisboa depois das 22h30 e, dada a hora, as buscas não puderam ser efectuadas. Terá sido nessa altura que a sua empregada “desviou” o computador pessoal.
Os investigadores concluíram que Sócrates perturbou o inquérito.
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