Tribunal iliba Benfica e reinventa a Disciplina
Clube lisboeta desresponsabilizado pelos incidentes do clássico com o FC Porto, que incluíram agressões à polícia. É "inconstitucional" culpá-lo pelos atos dos adeptos, diz o TCAS
O Tribunal Central Administrativo Sul ilibou o Benfica de responsabilidades nos vários incidentes protagonizados pelos seus adeptos no clássico com o FC Porto, referente à terceira jornada do atual campeonato. Numa sentença que se pode considerar explosiva, O TCA questiona o valor probativo dos relatórios da polícia e dos delegados, a identificação dos envolvidos com o clube e, sobretudo, considera inconstitucional o princípio da culpabilização dos clubes por atos dos adeptos, que é "apenas" a base de todos os regulamentos disciplinares do planeta, bem como da FIFA e da UEFA. A decisão é passível de recurso e, sabe O JOGO, a FPF seguirá esse caminho e provavelmente vencerá no Supremo Tribunal Administrativo.
Em causa está uma lista considerável de infracções consideradas provadas pelo mesmo acórdão. A saber: antes do jogo, agressões entre elementos dos "No Name Boys", no decorrer, agressões a um agente da polícia por elementos da mesma claque "com murros e pontapés"; depois da partida, e ainda no interior do recinto, elementos dos NNB derrubaram caixotes do lixo e vidrões, arremessando depois as garrafas de vidro e outros objectos contra a polícia e outros adeptos; ainda no interior do estádio, tentaram fechar a porta 10, provocando ferimentos em elementos das forças de segurança e, finalmente, já na Praça Centenário, arremessaram uma grade de ferro contra a polícia. Todos estes actos seriam automaticamente objecto de sanções, sustentados apenas nos relatórios dos delegados e da polícia, tanto na FPF, como na Liga, no Tribunal Arbitral de Lausana, na FIFA, na UEFA, na Federação alemã, italiana, inglesa, etc. Isso acontece porque, na jurisprudência desportiva, é entendido que penalizar os clubes é o único recurso de que as federações dispõem para prevenirem o mau comportamento dos adeptos.
O Benfica já havia recorrido para o Tribunal Arbitral do Desporto da multa de 8645 euros com que o Conselho de Disciplina da FPF o havia punido, mas o TAD manteve o castigo, agora revogado pelo Tribunal Administrativo. Numa sentença que, na prática, torna inviável a aplicação da maioria das normas disciplinares e tira dos ombros dos clubes a preocupação com vários dos problemas mais sérios da actualidade, como a violência no desporto ou os insultos racistas.
A sentença traz ainda a palco o debate sobre a nova legislação contra a dita violência no desporto, em parte porque a responsabilidade dos clubes é uma fatia relevante da lei, mas também porque dá razão ao legislador quanto à necessidade de haver um registo público dos adeptos que pertençam às claques (o "cartão do adepto"), justamente (entre outros objectivos) para que não se levante o problema da identificação comprovada dos infractores com os clubes. O relator do processo, Pedro Nuno Figueiredo, assina mesmo um voto de vencido em que recorda várias decisões do Tribunal Constitucional contrárias a esta do TCAS e recorda que mesmo um cartão de sócio pode ser apagado pelos clubes, de forma a negarem qualquer ligação aos eventuais transgressores. Curiosamente, o "cartão de adepto" é a principal objecção (vigorosa) do Benfica ao novo pacote legislativo. O clube lisboeta considera igualmente "inconstitucional" obrigar os adeptos a um registo para poderem ocupar, no estádio, lugares destinados às claques.
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