Kosta de Alhabaite

Nortenho, do Condado Portucalense

Se em 1628 os Portuenses foram os primeiros a revoltar-se contra o domínio dos Filipes, está na hora de nos levantarmos de novo, agora contra a corrupçao, o centralismo e colonialismo lisboeta!

Miguel Sousa Tavares - Onde acaba a liberdade

1 - Parece que Scolari, ou Madail, ou alguém da «família da Selecção», não gosta da forma excessivamente livre ou independente do jornalista da RTP Carlos Daniel relatar e comentar os jogos da Selecção (suponho que não se possa dizer, por exemplo, que o Ricardo sofreu três golos por entre as pernas, contra a Dinamarca, porque o Ricardo é o melhor guarda-redes do mundo e está acima de qualquer critica). Parece que também não gostam do programa da RTP "Trio de Ataque», apresentado igualmente por Carlos Daniel e que é, a milhas de distância, o melhor programa do género na televisão portuguesa, em que três homens cultos, inteligentes e independentes, falam livremente sobre futebol sem ter de falar «futobo-lês» nem prestar vassalagem aos senhores feudais do nosso futebol.

Demasiados contras para certas sensibilidades, saudosas dos tempos em que Suas Excelências falavam e os outros calavam e obedeciam. Vai daí, e ao contrário do que foi oficialmente desmentido, a Federação pressionou a RTP (que tem o exclusivo da transmissão dos jogos da Selecção), e a RTP calou o Carlos Daniel, sem lhe dar sequer conhecimento prévio. Deve ser agora uma questão de tempo até calar também o «Trio de Ataque». Eis-nos de volta aos bons velhos tempos da «Pátria somos nós» — para utilizar o ridículo título do «livro» daquele pobre pateta chamado Afonso Melo, que, tendo-se prestado a tudo (fazer de «gauleuter» nas conferências de imprensa da Selecção, sabujar Scolari e insultar, a mando, os «anti-patrióticos críticos» da Selecção) conseguiu, mesmo assim, ver dispensados os seus obsequiosos serviços.

Que fique estabelecido para todos os prudentes: a Selecção é sagrada, Madail é um génio, Scolari é infalível e a Pátria não se discute. Como dizia o outro.

2 - Se fosse eu a escolher, o FC Porto entraria hoje no Estádio dos Emirates, contra o Arsenal, em 4x2x2x2, com a seguinte composição: Hélton; Bosingwa, Bruno Alves, Pepe e Cech; Paulo Assunção e Raul Meireles; Lucho e Anderson; Quaresma e Lisandro.

Mas, com esta ou outra escolha, confesso a minha falta de optimismo para este jogo. Em minha opinião, o FC Porto tem equipa que chegue e baste para Portugal, não a tem para a Europa — como se viu bem contra o CSKA. Esta equipa tem cinco grandes jogadores e um génio; depois, tem mais uns três jogadores razoáveis e todos os restantes são banais. É uma equipa desequilibrada, com falta de bons jogadores em lugares fulcrais e falta de um banco à altura. A este propósito, mais uma vez constato, .e contesto, uma política de aquisições (apesar de tudo, este ano, comedida, em comparação com os anos anteriores), em que se compram sete ou oito jogadores novos e nenhum deles é titular. Não seria melhor política comprar só dois que fossem mesmo reforços?

Por mais que Jesualdo Ferreira insista em contrariar a ideia de que a equipa está crescentemente dependente do génio e inspiração do miúdo Anderson (e nem ele pode fazer outra coisa...), a verdade é que, como ainda este fim-de-semana se viu, sem o Anderson em campo, o FC Porto pode estar horas a tentar marcar um golo a um Beira-Mar, sem o conseguir.

Nas bancadas do Dragão comenta-se que o miúdo não vai ficar ali muito tempo, até porque o FC Porto já não terá nem metade do seu passe, tendo vendido recentemente 10% a um daqueles «empresários» que por lá parasitam. Não sei se será verdade ou não, mas obviamente não tenho grandes dúvidas que este génio que está a despontar na relva do Dragão não ficará lá tempo suficiente para chegarmos a ter saudades: está condenado a passar por nós como um cometa, em direcção ao céu infinito. Espero, ao menos, que, quando for vendido o que nos restar do seu passe, seja bem vendido e o dinheiro não sirva para ser desbaratado na compra de um cabaz de jogadores de segunda ou terceira linha.

3 - Quando vi as imagens do presidente do Gil Vicente a ser levado em ombros na assembleia-geral do clube, vieram-me à memória idênticas imagens dos sócios do Benfica em êxtase com Vale e Azevedo, naquelas célebres assembleias-gerais com «jagunços» contratados para intimidarem os discordantes. Sabe-se como acabou Vale e Azevedo e os benefícios que trouxe ao Benfica. Esperem agora para ver o que António Fiúza vai fazer ao Gil, por teimosia e vaidade. Infelizmente, a democracia tem limitações: garante que a maioria elege quem quer, mas não garante que elege quem deve. Do clube e do seu presidente não tenho pena — escolheram a cama em que se quiseram deitar. Tenho pena é dos jogadores que irão para o desemprego, dos miúdos das escolas do clube que ficarão sem poder competir e da Câmara de Barcelos, que construiu um estádio novo, com dinheiros públicos, para o Gil Vicente e agora fica com mais um dos elefantes brancos do futebol em braços. Ainda há mais uma hipótese, a última, de haver juízo e sentido das realidades. Mas não sei se os advogados deixam e se o presidente não temerá perder protagonismo, recuando.

4 - Não viram, não ouviram, não leram. Continuam todos em funções, sem sequer sentirem o incómodo de consciência ou a reacção de pudor de prestarem explicações públicas. Como se nada se tivesse passado, acobertados atrás da tal «legitimidade democrática». O que distingue um cavalheiro dos demais é que ele não precisa de ir a votos para ser sério, nem precisa dos votos para poder não ser sério: ou é ou não é. E o que mais falta no nosso futebol são cavalheiros: gente de honra, de palavra e de vergonha.

in "A BOLA", 2006.09.26

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