O afundamento do Norte não é um problema regional - é um problema nacional. As causas e consequências são graves e conhecidas. As saídas estão apontadas. Falta o resto, falta política
Há uns dois anos, João Cravinho disse numa entrevista que "o problema mais importante que o país tem pela frente é o afundamento do Norte". Os números davam-lhe razão. E continuam a dar. A riqueza média por habitante do país é, no Norte, pouco menos de metade do que a da região de Lisboa. O Norte, apesar do esforço exportador de que beneficia o país inteiro, continua a perder riqueza. O desemprego e as falências de empresas fustigam especialmente a região. Quando a comparação se faz entre Grande Porto e Grande Lisboa, a tristeza não recua: a riqueza da Grande Lisboa está mais de 60 pontos percentuais acima da do Grande Porto.
Um país cuja capital sofre, como se vê, de elefantíase é um país cujas assimetrias regionais tendem para o infinito. Um país macrocéfalo, dominado pelo centralismo e com um poder desmesurado na sua capital só pode acentuar o empobrecimento regional, engordando assim o seu centro, até este empanturrar e rebentar pelas costuras. Ao mesmo tempo, o resto do país definha, enruga-se nas suas capacidades e potencialidades, soçobra ao peso dos grandes.
Sim, é claro que o "afundamento do Norte" não é um problema regional - é um problema nacional. As causas e consequências são graves e conhecidas. Os estudos estão feitos e as saídas apontadas. Falta o resto - falta política.
Exemplo: na página 3 desta edição escrevemos que, no primeiro semestre deste ano, o aeroporto do Porto registou mais 500 mil passageiros face ao mesmo período do ano passado. Apesar de, em média, terem gasto menos (a crise aperta em todo o lado!), trata-se de uma excelente notícia. De resto, o Sá Carneiro, tem somado sucessos, muito graças aos voos low-cost: recentemente, foi considerado o segundo melhor aeroporto europeu e o quinto a nível mundial na categoria de dois a cinco milhões de passageiros.
É evidente que o aeroporto é fundamental para o crescimento do Norte, por todas e mais algumas razões. Contudo, a teimosia e a voracidade dos defensores do centralismo insistem em colocá-lo na suposta alienação em bloco da ANA. Se tal acontecer, daremos mais um passo rumo ao "afundamento do Norte" de que falava João Cravinho.
Contra isto - a concretizar-se, será um crime de "lesa-região" - ergueram-se já várias vozes. A última foi a de José António Barros, presidente da AEP. Ele, como outros, defende - e bem - a gestão local do equipamento. A ANA - claro! - está contra: já mandou fazer um estudo, nunca publicamente divulgado, que questiona a gestão privada do Sá Carneiro. Para mim, a coisa está clara: ou a ANA entende que no Norte está a desenhar-se, a propósito do aeroporto, uma espúria barreira de proteccionismo regional (e então convinha que o dissesse e provasse), ou a ANA teme que a gestão privada do Sá Carneiro se traduza em sã concorrência no sector e, logo, numa virtude para o país.
Se me obrigassem a votar, eu escolhia a segunda hipótese. Por ser, claramente, a que vai em sentido contrário ao da elefantíase instalada.
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