Domingos Ferreira, Professor/investigador Universidade do Texas, EUA, Universidade Nova de Lisboa, escreveu um artigo que se transcreve. Foi publicado no Público no passado dia 22 de Setembro. Está lá tudo o que move os governates de lisboa:
"Diz-se que uma mentira dita muitas vezes, ao fim de algum tempo, acaba por se tomar verdade. Ridiculamente, a propaganda e a ansiedade do Governo, corroborada por famosos comentadores políticos e economistas supostamente sérios, levaram os nossos governantes a ver aquilo que mais ninguém via. Portugal e a Irlanda (ao contrario da Grécia) seriam o exemplo inequívoco do sucesso das medidas políticas de austeridade. Porém, a crueldade dos números nunca deixa dúvidas. Aquilo que o Governo teimosamente não quer ver nem quer dizer é que em apenas um ano a dívida pública subiu de 100% para 112%, e é certo que suba para 118% no próximo ano. O desemprego subiu de forma galopante de 10%, em 2011, para perto de 16%, em 2012. Estima-se que no início do próximo ano esta taxa situar-se-á nos 18%, agravada pelo encolhimento da economia, que será cerca de 3,5%.
Assim, por muito que o Governo continue a insistir, o facto é que no próximo ano não haverá alterações positivas. Há cerca de um ano, numa “Carta aberta ao primeiro-ministro”, publicada nesta coluna, alertei para o mau resultado das medidas de austeridade, que lamentavelmente acabou por se confirmar. Mas as más notícias não se ficam por aqui. De acordo com um estudo da universidade de Harvard, existe um comportamento-padrão nas crises originadas pelo excesso de austeridade. Verificou-se que estas demoraram em média cerca de dez anos a ser mais ou menos ultrapassadas. O Japão representa um outlier neste comportamento-padrão, pois a crise arrasta-se há já vinte anos, apesar do acesso a financiamentos com baixíssimas taxas de juro. Dada esta equação, colocam-se as questões: sabendo que as medidas de austeridade de combate à crise resultaram no agravamento dramático da situação económica, porque ë que o primeiro-ministro insiste no erro e não inverte a estratégia? Porque é que não toma as convenientes medidas de estímulo de relançamento económico e de criação de emprego? Pela simples razão de que este está a implementar as cartilha ideológica que serve os interesses das grandes corporações económicas e políticas intenacionais, apesar de fortemente lesivos aos interesses dos portugueses, o que para eles pouco interessa. De acordo com esta linha ideológica, um governo sério é sempre a causa do problema e nunca a solução. Isto é, um governo sério não só promulga legislação regulatória e fiscalizadora, tendo em vista evitar abusos, posições dominantes e práticas predatórias, mas também lança impostos sobre essas poderosas corporações de forma a que haja uma maior equidade e igualdade na distribuição da riqueza.
Consequentemente, estas auferem menores lucros, o que lhes desagrada profundamente.
Assim, há que diminuir e afastar a autoridade dos governos e influência da sociedade civil. Por isso, é necessário, naquela perspectiva, não só privatizar todos os sectores da economia, nomeadamente os sectores estratégicos nacionais apetecíveis e isentos de risco, mas também aquilo a que eufemisticamente denominam “Flexibilizar o Mercado Laboral”, quando, na verdade, se trata apenas de cortar nos salários. Tudo isto está patente em diversas medidas, tais como a recente transferência de parte dos custos da TSU para os trabalhadores em benefício do sector empresarial, no selvagem aumento dos impostos para os mais vulneráveis e na privatização de empresas públicas sem que se tenha observado qualquer reestruturação na economia portuguesa.
Pois, maior competitividade significaria afectar os interesses dos mais ricos e influentes. Ingenuamente, os eleitores pensam que a melhor opção para um primeiro-ministro que quer ser reeleito é fazer aquilo que prometeu durante a campanha , eleitoral: a satisfação dos eleitores, garantir-lhe-ia a reeleição.
Contudo, na era dos interesses económicos globais, os líderes dos pequenos países como Portugal não estão preocupados com os seus eleitores. Assim, se alguns dos líderes destes países terminarem o mandato usufruindo da estima do grupo de Davos, estes não hesitarão em recompensa-los com uma posição dourada na Comissão Europeia, no FMI ou noutros organismos afins, mesmo que seja desprezado pelos próprios conterrâneos. Aliás, este desprezo constitui uma mais-valia na demonstração de lealdade e solidariedade com aquele grupo. Isto está bem ilustrado no paradigmático caso de apoio de Durão Barroso à invasão do Iraque, tendo-lhe garantido uma posição na Comissão Europeia ou na desprezível afirmação de Passos Coelho “que se Iixem a eleições”, estando certo, claro, que terá melhores dias."
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