Alheira, tabafeira ou “chouriço judeu” são os nomes para um enchido com uma história de mais de 500 anos. A Goodyear diz-lhe onde encontrar as melhores.
Todo a região de Trás-os-Montes é conhecida pela alheira, mas a fama das de Mirandela supera todas as outras. Como todos os bons clássicos da gastronomia, há capelinhas que merecem a romaria de lá irmos só para provar o famoso enchido, mas é também a base para algumas apostas mais modernas e gourmet. A Goodyear conta-lhe a história da alheira de Mirandela e uma mão cheia de locais por todo o país onde pode provar alguns dos melhores exemplos.
O “chouriço judeu”
A sua história começou no séc XV, quando judeus expulsos de Castela tomam residência na zona de Trás-os-Montes.Numa época em que ainda eram perseguidos, como a religião os impedia de comer porco, rapidamente se evidenciariam por serem os únicos a não colocar os enchidos a fumar à lareira se não fosse a artimanha que desenvolveram e que nos chega hoje como um monumento da gastronomia portuguesa. A alheira original não levava porco, apenas incluía carne de aves e caça, uma massa de pão, azeite, sal, alho e colorau, e o caldo onde a carne era cozida. Enchida uma tripa de vaca, as famílias judias tinham assim uma iguaria sem sinais da carne impura mas que os ajudava a disfarçar entre a vizinhança.
Revelado o segredo, os cristãos começaram a incluir carne de porco e os séculos seguintes serviram para aprimorar a arte do “chouriço judeu”, como também lhe chamaram. As mais famosas são sem dúvida as de Mirandela, mas toda a região transmontana e parte da Beira tem bons exemplares da alheira. Geralmente são fritas em azeite e servidas com legumes cozidos, mas podem ainda ser assadas no forno, na brasa ou estufadas e envolvidas com couve lombarda. O ovo, as batatas e os grelos cozidos são a companhia habitual.
Mirandela, capital da alheira
Curiosamente, conta-se que a alheira que deu fama a Mirandela nem sequer era realmente da terra mas, na época, levava o carimbo da estação de comboio onde era levantada. Contudo, o concelho agarrou bem na bandeira e, hoje em dia, é sede para uma economia à volta deste enchido que conta com 12 grandes fábricas e é agora de Indicação Geográfica Protegida. Este selo de qualidade foi obtido em 2016 e define as regras de como deve ser confeccionada a alheira para pode ser considerada uma verdadeira Alheira de Mirandela. Já não há comboio da Linha do Tua para levar as alheiras para o resto do território, mas Mirandela continua a dar jus à sua fama.
É pela cidade transmontana que começamos o nosso roteiro da alheira. Claro que é em Mirandela que vamos encontrar alguns dos melhores restaurantes com este enchido no menu, em virtude do contacto próximo com os produtores, mas a verdade é que a cozinha de Trás-os-Montes faz-se com mestria suficiente para tudo resultar bem. A Adega é sinal disso mesmo e tem o serviço e ambiente tradicional que nos asseguram que se vai comer bem. Aqui a alheira é servida grelhada e com batatas a murro e legumes, e acompanhada a vinho verde. A posta à mirandesa é a nossa recomendação para o prato principal.
O Flor de Sal é uma aposta mais sofisticada mas não menos agradável. A alheira aparece aqui em diversas apresentações, numa açorda, grelhada, com o ovo a cavalo, com molho de vinho do Porto, ou numa terrina com laranjas e jeropiga, e na companhia da azeitona, outra das especialidades locais. Com uma bela vista sobre o rio Tua, é uma visita mais romântica ao coração da alheira.
Alheira na Invicta
Outro nome tradicional para a alheira é “Tabafeira” e foi essa também a designação escolhida para criar um restaurante exclusivamente dedicado à alheira de Mirandela no Porto. O Tabafeira tem empadas, folhados, bruschettas, folares e até hambúrgueres, sempre com o típico enchido como ingrediente principal. Como prato principal há alheira de aves ou de caça, acompanhada com presunto, ananás, ovo escalfado ou queijo fresco, em diversas e imaginativas especialidades.
A curta distância do Porto, em Louredo, Paredes, Teresa Ruão está na Cozinha da Terra a revelar-se um nome a fixar na gastronomia tradicional portuguesa. Prémio Garfo de Ouro de 2015 do “Boa Cama, Boa Mesa” do Jornal Expresso, não poderíamos salientar uma só das criações aqui apresentadas sem achar que fomos injustos para todas as outras. Contudo, foi a alheira que motivou a sua inclusão neste mini-roteiro, por isso temos que salientar os belíssimos exemplares aqui servidos, produto do próprio restaurante, e que só servem durante o tempo frio, com grelos cozidos e salteados.
Lisboa transmontana
Cozinheiras minhotas e transmontanas são presença mais do que regular em bons restaurantes da capital. Há alguma coisa nas mulheres do norte que as torna mestres da cozinha cheia de substância mas, mesmo assim, não é fácil encontrar boas alheiras em Lisboa. O Floresta do Salitre e o Alfaia são bons exemplos de menus simples e tradicionais, e incluem habitualmente alheiras perfeitamente seleccionadas e confeccionadas.
O Taberna da Esperança tem o ambiente retro agora tão na moda, uma profusão de “tapas” e petiscos para todos os gostos, e serve uma clássica alheira com ovos mexidos que é suficiente para nos acalmar a alma transmontana. Não é como a que a avó fazia, mas está próxima Q.B.. Em Campolide, a Tasquinha do Lagarto, é o clássico restaurante de bairro, com um aspecto quase banal, mas a qualidade da comida aqui servida justifica a fama que já tem. A alheira? É a melhor que vai encontrar a sul de Coimbra…
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