(*) CRUZES, CREDO, CANHOTO !!!!!!
Na quarta-feira, dia 28, o Benfica completa mais um aniversário. Para todos aqueles que frequentaram a quarta classe e dominam portanto os princípios elementares da aritmética ou do ábaco, perfaz 99 anos. Para os restantes, completa a idade que se quiser.
A lenda diz que, depois de criar o mundo, Deus, já estafado, guardou as peças defeituosas que lhe restaram para um último projecto: o Benfica, espécie de Frankenstein moderno. É para honrar esta instituição que evocaremos esta semana os episódios mais marcantes da história do Benfica, tal como a recordamos. Deixaremos propositadamente de fora episódios já lembrados, como os 7-0 de Vigo ou os 7-1 de Alvalade ou mesmo os 5 secos com que o Grandioso FCPorto lhes ofereceu aquaundo de um recente Supertaça. A saga terminará apropriadamente no sábado, dia em que se completam 400 dias sobre o último penalty assinalado contra o Benfica para a Liga…
A Fundação
O Benfica nasceu em 1908, ano de boa colheita, marcado pelo regicídio e pela invenção do contador Geiger. 1908 foi também o ano em que o então jovem Rui Costa completou o exame de conclusão da instrução primária e Pedro Mantorras ensaiava os primeiros passos com um joelho de aço inoxidável, projecto infelizmente falhado da Junta Ultramarina das Máquinas de Guerra. E, claro, 1908 foi o ano do Benfica. Para trás, ficavam anos atribulados de fusões e cisões, dívidas e arrestos, mas muita, muita paixão.
Para perceber o clube, torna-se aliás fundamental lembrar os seus múltiplos antecessores porque, de certa forma, o Benfica foi filho de pai incógnito, tantos foram os potenciais progenitores.
A máquina do tempo leva-nos a 1904 e ao bairro de Belém. Cheira mal nesta Rua Direita de Belém, beco fétido e putrefacto onde apenas um germe particularmente patogénico poderia prosperar. Joga-se à bola. De um lado, os irmãos Catatau, marinheiros de profissão e súcia de malfeitores que fariam empalidecer de inveja outros irmãos célebres – os Metralha. Do outro, alunos e ex-alunos da Real Casa Pia de Lisboa. Apesar da proveniência, asseguram os historiadores do clube, nem todos os futuros fundadores do Benfica seriam sodomitas. O farmacêutico Pedro Franco era vegetariano e gritava aos quatro ventos que marinheiros não contavam como carne. O jovem Cosme Damião, verdadeiro gentleman, insistia para que o tratassem por Irene. Em vão.
As partidas jogavam-se nas Terras do Desembargador, terreno partilhado com os Regimentos 2 e 4 de Cavalaria [verídico], combinação perigosa e pouco abonatória para os equídeos. A história oficial do clube assegura que os jovens do Grupo Sport não aguentaram ser preteridos pelas prioridades dos regimentos e partiram para outro campo. Hoje, sabe-se a verdade: foram os cavalos que pediram para não treinar no mesmo recinto dos futuros benfiquistas. Quem os censura?
Montou-se entretanto sede. Apropriadamente, ficava na Travessa das Zebras [palavra, há aqui esforço honesto de documentação!]. Voltaram a protestar as zebras. Uma vez mais, os ungulados despejavam o proto-Benfica: 2-0!
A um clube falta naturalmente material. Fez-se um inventário e, no verso de um talão de tinturaria, organizou-se a primeira encomenda. Seguiu para Londres o pedido de três bolas e um apito [verídico]! Os meninos conheciam mal as regras, mas já sabiam que mais valia terem o apito no bolso!
Surgem entretanto vultos no desporto do clube. No atletismo, destaca-se Cabeça Ramos, quanto mais não seja pelo infeliz nome com que foi cunhado. Mas Cosme Damião, diligente, queria definir outras prioridades. Enquanto os sócios pretendiam participar em torneios e disputar jogos, o fundador do Benfica organizou histórica assembleia para definir a primeira questão fracturante do novo clube: o tom e textura dos casacões do equipamento. Acabou por ser votado o traje em veludo cotelet que ainda hoje perdura, com voto contra de Cabeça Ramos, cuja declaração de protesto ecoou, estridente, pelos anais da história:
“Este clube parece-me cada vez mais estranho! Disseram-me para vir jogar à bola, mas já me apalparam três vezes o rabo desde que estamos em plenário. Ora eu não vim de Olival Basto de carroça para me beliscarem a padiola. Está certo que estamos todos de calções e já me disseram que isto se faz muito em Lisboa, mas eu tenho cá as minhas desconfianças. Podem enfiar o casaquinho de veludo onde bem vos aprouver, excelências. Eu tenho um caldeiro ao lume!”
Saiu e, na sala, tombou pesado silêncio. «Irene» Damião levantou-se pesadamente e lançou dichote lendário: “Pois que vá. Foi o primeiro entre todos a sair. E pluribus unum. Que seja esse o nosso lema.”
Na quarta-feira, dia 28, o Benfica completa mais um aniversário. Para todos aqueles que frequentaram a quarta classe e dominam portanto os princípios elementares da aritmética ou do ábaco, perfaz 99 anos. Para os restantes, completa a idade que se quiser.
A lenda diz que, depois de criar o mundo, Deus, já estafado, guardou as peças defeituosas que lhe restaram para um último projecto: o Benfica, espécie de Frankenstein moderno. É para honrar esta instituição que evocaremos esta semana os episódios mais marcantes da história do Benfica, tal como a recordamos. Deixaremos propositadamente de fora episódios já lembrados, como os 7-0 de Vigo ou os 7-1 de Alvalade ou mesmo os 5 secos com que o Grandioso FCPorto lhes ofereceu aquaundo de um recente Supertaça. A saga terminará apropriadamente no sábado, dia em que se completam 400 dias sobre o último penalty assinalado contra o Benfica para a Liga…
A Fundação
O Benfica nasceu em 1908, ano de boa colheita, marcado pelo regicídio e pela invenção do contador Geiger. 1908 foi também o ano em que o então jovem Rui Costa completou o exame de conclusão da instrução primária e Pedro Mantorras ensaiava os primeiros passos com um joelho de aço inoxidável, projecto infelizmente falhado da Junta Ultramarina das Máquinas de Guerra. E, claro, 1908 foi o ano do Benfica. Para trás, ficavam anos atribulados de fusões e cisões, dívidas e arrestos, mas muita, muita paixão.
Para perceber o clube, torna-se aliás fundamental lembrar os seus múltiplos antecessores porque, de certa forma, o Benfica foi filho de pai incógnito, tantos foram os potenciais progenitores.
A máquina do tempo leva-nos a 1904 e ao bairro de Belém. Cheira mal nesta Rua Direita de Belém, beco fétido e putrefacto onde apenas um germe particularmente patogénico poderia prosperar. Joga-se à bola. De um lado, os irmãos Catatau, marinheiros de profissão e súcia de malfeitores que fariam empalidecer de inveja outros irmãos célebres – os Metralha. Do outro, alunos e ex-alunos da Real Casa Pia de Lisboa. Apesar da proveniência, asseguram os historiadores do clube, nem todos os futuros fundadores do Benfica seriam sodomitas. O farmacêutico Pedro Franco era vegetariano e gritava aos quatro ventos que marinheiros não contavam como carne. O jovem Cosme Damião, verdadeiro gentleman, insistia para que o tratassem por Irene. Em vão.
As partidas jogavam-se nas Terras do Desembargador, terreno partilhado com os Regimentos 2 e 4 de Cavalaria [verídico], combinação perigosa e pouco abonatória para os equídeos. A história oficial do clube assegura que os jovens do Grupo Sport não aguentaram ser preteridos pelas prioridades dos regimentos e partiram para outro campo. Hoje, sabe-se a verdade: foram os cavalos que pediram para não treinar no mesmo recinto dos futuros benfiquistas. Quem os censura?
Montou-se entretanto sede. Apropriadamente, ficava na Travessa das Zebras [palavra, há aqui esforço honesto de documentação!]. Voltaram a protestar as zebras. Uma vez mais, os ungulados despejavam o proto-Benfica: 2-0!
A um clube falta naturalmente material. Fez-se um inventário e, no verso de um talão de tinturaria, organizou-se a primeira encomenda. Seguiu para Londres o pedido de três bolas e um apito [verídico]! Os meninos conheciam mal as regras, mas já sabiam que mais valia terem o apito no bolso!
Surgem entretanto vultos no desporto do clube. No atletismo, destaca-se Cabeça Ramos, quanto mais não seja pelo infeliz nome com que foi cunhado. Mas Cosme Damião, diligente, queria definir outras prioridades. Enquanto os sócios pretendiam participar em torneios e disputar jogos, o fundador do Benfica organizou histórica assembleia para definir a primeira questão fracturante do novo clube: o tom e textura dos casacões do equipamento. Acabou por ser votado o traje em veludo cotelet que ainda hoje perdura, com voto contra de Cabeça Ramos, cuja declaração de protesto ecoou, estridente, pelos anais da história:
“Este clube parece-me cada vez mais estranho! Disseram-me para vir jogar à bola, mas já me apalparam três vezes o rabo desde que estamos em plenário. Ora eu não vim de Olival Basto de carroça para me beliscarem a padiola. Está certo que estamos todos de calções e já me disseram que isto se faz muito em Lisboa, mas eu tenho cá as minhas desconfianças. Podem enfiar o casaquinho de veludo onde bem vos aprouver, excelências. Eu tenho um caldeiro ao lume!”
Saiu e, na sala, tombou pesado silêncio. «Irene» Damião levantou-se pesadamente e lançou dichote lendário: “Pois que vá. Foi o primeiro entre todos a sair. E pluribus unum. Que seja esse o nosso lema.”
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