Somos todos neo-keynesianos?
"Ninguém se preocupa com o inevitável aumento dos défices públicos em resultado dos pacotes de estímulo à economia anunciados dia sim, dia sim.
A contaminação da economia real pela crise financeira colocou o mundo à beira da recessão. Como um mal nunca vem só, a rápida deterioração das perspectivas económicas internacionais ressuscitou o fantasma da deflação. Em linguagem corrente deflação significa que os preços dos bens e serviços, em vez de aumentarem como sucede em períodos de inflação, descem.
A deflação não é apenas uma ameaça é um perigo real. A forte quebra da actividade económica era só por si suficiente para diminuir a pressão sobre os preços. Se a isso juntarmos a descida das matérias primas – veja-se o caso do petróleo por exemplo – não admira que muitos economistas prevejam que a inflação continue a baixar, podendo mesmo atingir valores negativos.
Se nada for feito, o mundo ou pelo menos uma boa parte dele entrará em deflação. E se à primeira vista a descida dos preços parece positiva para os consumidores, na realidade isso não acontece.
O problema da deflação, isto é da queda generalizada dos preços, é que as pessoas adiam decisões de consumo na esperança de que os preços baixem ainda mais. E quando as famílias deixam de consumir, as empresas cancelam investimentos. Em vez de contratarem, despedem trabalhadores. Mais desemprego significa menos dinheiro no bolso, logo menos consumo. Ou seja, a deflação reduz o consumo, que reduz o investimento, que volta a reduzir o consumo, que volta a reduzir o investimento, que... Um círculo vicioso que pode terminar numa depressão, (recessão + deflação) semelhante à que fustigou os EUA dos anos 30.
Para lidar com este tipo de situações, o economista John Maynard Keynes propôs uma combinação de políticas monetária e fiscal. No primeiro caso baixando os juros, no segundo aumentando os gastos públicos. A ideia em ambos os casos era estimular a procura e voltar a colocar a economia nos carris.
Com o triunfo das teses ditas neo-liberais que reduziram o Estado ao papel de mero espectador da cena económica, aumentar as despesas públicas para estimular a economia, como defendia Keynes, passou a ser uma heresia. Argumento: as medidas que aumentam o défice público conduzem, mais tarde ou mais cedo, à subida das taxas de juro, que são o único passaporte para um crescimento sustentado.
Mas isso era antes. Agora, pelo menos a avaliar pelas reacções, (quase) ninguém se preocupa com o inevitável aumento dos défices públicos em resultado dos pacotes governamentais de estímulo à economia que estão a ser anunciados dia sim, dia sim. Será porque somos todos neo-keynesianos... até voltarmos a ser novamente liberais?"
Carlos Rosado de Carvalho
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